sábado, julho 18, 2009

O BOM E O MAU LIVRO

Pablo Gobira
O Cometa, Belo Horizonte, 2007

Dizem por aí que os Salões de Livros estão esvaziando de leitores, assim como as Bienais. Apesar do Veríssimo dizer que se impressiona com a grande procura de livros pelas crianças nas livrarias – lógico, falamos de Harry Potter –, não sei se é uma verdade que, nesse meio, a quantidade de “leitores” vêm aumentando.

A verdade mesmo é que eu não gosto de pensar na literatura, ou melhor, na leitura, desse modo tão direcionado e estrito. Prefiro sinalizar conceitos que são mais específicos e os quais gostaria de expor em síntese: a) Mercado Editorial, compreendendo APENAS as editoras, distribuidoras e as livrarias, ou seja, a detenção dos meios de produção e de distribuição do “livro”; e b) leitor, compreendendo simplesmente “aquele que lê”.

A acepção de “ler” ou “leitura” é a chave da discussão. É, também, o que o mercado editorial esconde do público em geral, apoiado nos mecanismos ideológicos que lhe competem, enquanto uma discussão necessária e que passa pela questão da autoria e dos tais direitos autorais.

Desse modo, a sociedade contemporânea necessita que a noção de “leitura” e “ler” seja ampliada radicalmente. Devemos lembrar de Paulo Freire e sua idéia de “leitura de mundo”, como concepção necessária para o educador se desenvolver junto ao educando, a ponto de se entender o segundo como tão competente para a leitura de algumas significações quanto o educador em outras.

Porém, o mundo contemporâneo não considera que “ler o mundo” é tão importante quanto “ler um livro”. Torna-se importante, epistemologicamente, compreender que o ato de ler transcende: o objeto livro; e os objetos de suportes virtuais com sistemas semióticos amparados pelo verbo.

O ato de ler atinge outras linguagens como a fílmica e a musical, a teatral; e gêneros como a telenovela, as séries, as mini-séries, etc.

A centralização (como objeto) da leitura no livro e nos periódicos como únicos meios de se atingir o “espaço da cultura” são apenas mais algumas estratégias de polarização implementadas pelo mercado (e aqui não estou falando somente daquele editorial que citei) que gera uma separação entre o “bom” e o “mau” livro e de sua importância.

Claro que a idéia não é a abolição da leitura do livro. Essa discussão se aproxima daquela outra de caráter político-cultural que envolve o mercado fonográfico e o “problema” do MP3.

Ao optar por entender a vida como uma constante leitura, há uma ampliação do conceito de “livro”. Também há o desprendimento da idéia de existência do “bom” e do “mau” livro. Assim, renova-se a esperança naquelas crianças que se enfileiram nas livrarias para comprar o livro da Rowling, ou das outras que fazem filas nas bibliotecas. Pois mesmo submetidas a um artifício do mercado editorial, sua vida tem mais chances de voltar a um normal de “apatia” a esse mercado, do que se submeter inteiramente a ele. Também, quem é que pode se manter mesmo como um leitor-comprador assíduo em uma sociedade como a ocidental?

Há que se mover para que uma nova consciência se espalhe com a discussão do acesso à cultura enquanto construção coletiva sem essa separação existente entre os que podem e os que esperam que seja interessante dar-lhes esse poder. Deve-se estimular algo próximo às primitivas e constantes grafitadas em muros, ou rabiscos encadernados, mesmo que aquelas odiadas e informais.

Entendendo a leitura como leitura de sentidos, assumimos que todos também os produzimos permanentemente. Assim, não há como se realizar outro patenteamento além da força de trabalho que se vende nesse dia-a-dia e que nos separa da real ação de transformação do mundo.

O que sobra, feliz ou infelizmente, é o mercado editorial chorando e se satisfazendo com os fluxos e refluxos dos consumidores em Salões e Bienais que estão longe de serem dos livros, mas são, veríssimamente, das livrarias que neles expõem suas mercadorias secularmente destinadas aos letrados.

E assim pergunto: quem, afinal, são os letrados?

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