sábado, julho 18, 2009

UMA NOVA _______ É POSSÍVEL

Pablo Gobira
Jornal O Cometa, Setembro/2007

Desde antes da década de 1970 já existem elogios à nossa classe dominante. E aqui quero chamar de “dominante” aqueles que controlam os meios de produção e não, simplesmente, aqueles que detém poder. Até o Foucault já nos mostrou que o poder - e suas relações – está em todo lugar com alguém mandando e sendo mandado. Porém, a detenção do controle dos meios de produção apenas alguns possuem.

Fundamentando-me em Darcy Ribeiro (o crítico, por favor!), também é necessário resgatar o conceito de elite com o qual ele trabalhou. A esse conceito, no caso latino-americano, devemos anexar um adjetivo que o autor associou: elite externa. Então, para Darcy, a elite seria essa classe controladora dos meios de produção. A elite brasileira seria essa elite, com a característica de que produz para os interesses externos ao país e não aos internos, do seu povo, da nação, ou qualquer outra entidade.

O antropólogo afirma que, desde a colonização, “aqui no Brasil se tinha inventado ou ressuscitado uma economia especialíssima, fundada num sistema de trabalho que, compelindo o povo a produzir, o que ele não consumia – produzir para exportar – permitia gerar uma prosperidade não generosa, ainda que propensa desde então, a uma redistribuição preterida.”

Na verdade, em uma das vezes que o antropólogo usa essa noção, ele o faz de maneira muito perspicaz. Aliás, esse é um adjetivo que cabe ao intelectual em qualquer área que atuou. Lógico, algumas revisões são necessárias. Portanto, vamos a uma delas.

O texto ao qual me refiro é o ensaio “Sobre o óbvio”, do livro Ensaios Insólitos, de 1979. Nele, o autor realiza, de maneira irônica e... perspicaz, uma crítica à colonização da América do Sul. Seu texto desconstrói algumas teses (consideradas ironicamente como “obviedades”), tais como: “os pobres vivem dos ricos”, pois “sem rico o mundo estaria incompleto, os pobres estariam perdidos”; “os negros são inferiores aos brancos”; e “nós, brasileiros, somos um povo de segunda classe, um povo inferior, chinfrin, vagabundo”.

Depois de negar as quatro obviedades, sendo que a primeira era a de que o Sol gira em torno da Terra, Darcy começa a construir a tese da riqueza do Brasil que está sendo extraída e levada para fora do país, assim como ocorre em todos os países latino-americanos. A verdade é que o texto é bem atual, levando-se em conta esse contexto de debates que, hoje, se direcionam para o Plebiscito Popular pela anulação do leilão da Cia Vale do Rio Doce, privatização que teria sido fraudulenta em 1997 (http://www.avaleenossa.org.br).

Diversos exemplos são dados pelo autor que leva a crer que, a qualquer momento, não apenas a elite, mas todos os latino-americanos irão fazer as malas e – veja que não estou usando o verbo errado, não quero dizer “ir”, mas – VOLTAR para a Europa. Para Darcy Ribeiro, a nossa elite é a que vive melhor no mundo. Também é a mais sábia na profissão de destruir vidas, utilizar mão-de-obra barata (para não dizer escrava até hoje), e ainda se dizer responsáveis socialmente. Para ele, “os culpados de nosso subdesenvolvimento somos nós mesmos, ou melhor, a melhor parte de nós mesmos: nossa classe dominante e seus comparsas”.

Tudo no texto do antropólogo parece nos dizer o motivo para o “país não ir pra frente” é a exploração colonial, a neocolonização contemporânea, e ainda a ajuda dada pela elite interna para a elite externa que é com quem eles querem se parecer. Qual seria, então, a saída proposta pelo professor Darcy Ribeiro nesse contexto de 10 anos de seu falecimento?

O que se pode deduzir desse seu raciocínio é que se tivéssemos uma elite mais comprometida com o desenvolvimento sócio-econômico da nação e suas virtudes, tudo estaria melhor. A esperança é sempre a última que morre nesses casos.

O que se espera é que a elite se solidarize? Ou devemos esperar que a elite não queira mais conviver com a fome e a miséria? Ou, ainda, devemos esperar que toda a mão-de-obra morra dessa fome e dessa miséria? Não! A elite, como o disse o Professor Darcy, não é burra o bastante para matar os únicos capazes de lhe servir, mas é inteligente o bastante para manter longe dos espaços do “saber” elitizado aqueles que a servem enquanto ocupam as universidades públicas.

O interessante na obra do antropólogo é que esta questão é uma incógnita a se discutir. O “papel dos intelectuais no contexto político” fica claro na medida em que a crítica o discute nas academias. Agora, o “papel da elite” vai se dissolvendo no meio dos textos levando a apenas aquela dedução salientada.

A “elite”, quase nunca antes de Darcy Ribeiro, foi associada à exploração de mão-de-obra, detendo os meios de produção nacionais no desejo de fugir daqui com o que pilhou. Com todo esse distanciamento entre os comandantes e os comandados, parece ficar difícil, até para os “pensantes”, imaginar o fim dessa separação no mundo. Principalmente nesse contexto latino-americano descrito tão bem pelo antropólogo.

Hoje, fora das academias, a agenda política da nação – assim como se vê nas mídias diversas – não lista a discussão sobre: se “ser” ou “ter” elite é algo bom. Esquecemos que existem os que possuem e os que não possuem.
Lembra-se que existem os “sem voz” somente quando se deseja escutar os seus discursos, ou quando os mesmos valem alguma coisa para a lógica do mundo: um livro que seja, pois os livros também são mercadorias. Como exemplo temos os nichos de mercado que se formam das alteridades.

Estamos mais preocupados, é verdade, com os oxímoros: “apagões aéreos”; ou “políticagem sem corrupção” (porque, devemos lembrar, o conceito de política não é o mesmo de “representação política”).

Nesse contexto de vazio em termos de discussões teórico-práticas no cenário político, deve ser dito por fim, que não somente para o antropólogo, mas para o Fórum Social Mundial, o Fórum Social Brasileiro e, ainda, o Econômico, a palavra que preenche a lacuna no título deste texto é, infelizmente, elite.

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